sexta-feira, 6 de junho de 2014

COPA DAS COPAS



ZERO HORA 06 de junho de 2014 | N° 17820

ARTIGO

por Giovana dal Pozzo Sartori*




Vivo num país em que espero 40 minutos por um ônibus superlotado, em más condições, sem saber quanto vou demorar até o destino. Em que o lotação me custa R$ 17,60 por dia. Perco horas no trânsito e não é seguro estacionar meu carro na rua nem parar em sinaleiras. Roubam o estepe, as rodas, o carro todo. Os estacionamentos são caríssimos. Ligo a TV: greve do transporte público em SP, RJ, SC. As capitais estão sem mobilidade urbana. Nosso ex-presidente disse que metrô é “babaquice”, que brasileiro vai até o estádio a pé ou de jumento se precisar.

Em plantão, vi um pai perder seu filho num acidente em nossas intransitáveis estradas, amassado por um ônibus que, na ausência de fiscalização, transitava sem freio. Tenho medo de viajar. Medo de que meus pais venham me visitar. Aqui, a chegada não é garantida.

Vivo num país em que trabalhamos até maio apenas pra pagar impostos, que retornam na forma de estradas perigosas, insegurança pública, educação e saúde falhas. Políticos roubam nosso trabalho. Nossa produção muitas vezes não pode ser es- coada por falta de estradas e portos. Mas financiamos a construção de portos em Cuba.

Pacientes dormem na fila por uma consulta, esperam um ano por uma tomografia pelo SUS. Entram na Justiça e esperam mais um ano por um quimioterápico. E morrem nesse meio tempo. Médicos fecham UTIs por falta de até mesmo luvas. Mas o governo acha melhor trazer mais médicos.

Abri o jornal e vi que obras de que precisamos há tanto tempo não ficarão prontas nem pra receber turistas na Copa. Mas que Copa? Não a vejo nas ruas, na população… As passagens aéreas do período de jogos estão em promoção. Será que os turistas estão com medo de vir a um país colapsado, em que queimamos ônibus nas ruas e em que 56 mil pessoas são assassinadas por ano? Será que todo aquele dinheiro que tanto precisaríamos para reformular elementos básicos do país não terá o retorno esperado?

Depois de tudo isso, querem que torçamos para a Seleção neste mês. Desculpa, Brasil, mas eu não consigo. E quem consegue se importar se o Brasil vencerá essa Copa, em frente à necessidade de vencer tantas outras?

ESTUDANTE DE MEDICINA NA UNIVERSIDADE FEDERAL DE CIÊNCIAS DA SAÚDE DE PORTO ALEGRE

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