domingo, 13 de julho de 2014

A COPA DA INTERNET

ZERO HORA 13 de julho de 2014 | N° 17858. ARTIGOS

Nelson Mattos*



Que brasileiro gosta de futebol e que o país para durante a Copa do Mundo, todo mundo sabe. Mas que brasileiro adora tecnologia e é um dos povos que mais utilizam a internet no mundo talvez não seja do conhecimento de todos. O tráfego na internet no Brasil já é o quinto maior do mundo. Somos tão viciados em internet, que 88% dos internautas brasileiros consideram a internet a mídia mais importante, superando TV, jornais e revistas. Nossa paixão é tão grande, que a péssima qualidade da internet brasileira não é empecilho a sua utilização. O Brasil tem a 87ª internet mais lenta do mundo e, dos 32 países participantes da Copa, o Brasil só é mais rápido do que Costa Rica, Irã e Argélia. Só mesmo a paixão por tecnologia pode levar os brasileiros a usar tanto uma das internets mais lentas do mundo!

Assim, não é surpresa que esta Copa tornou-se a Copa da Internet.

Brasileiros, mais do que nunca, se mantiveram conectados à internet para assistir a transmissões online, replays dos jogos, manter-se informados, dar opiniões etc. A Copa de 2014 no Brasil tornou-se o evento esportivo com maior tráfego na internet até hoje registrado, superando o tráfego de toda a Copa de 2010 já nos primeiros 10 dias. O tráfego do Mundial foi equivalente a três vezes o tráfego do Brasil a cada mês.

Uma vez que esse tráfego extra foi gerado principalmente por streamings de vídeo, estima-se que milhões de pessoas assistiram aos jogos ou destaques pela internet. Como a maior parte do acesso aconteceu durante a semana, é bem provável que tenha sido feito dos locais de trabalho, onde a internet é mais rápida, permitindo, assim, assistir aos jogos diretamente pelo computador.

Era de se esperar que aqueles que não tinham condições de ir aos estádios utilizassem a internet para se manter ligados ao que acontecia. Porém, o grande crescimento de celular como dispositivo de acesso à internet fez com que, mesmo nos estádios, os brasileiros se mantivessem conectados. De acordo com a Cisco, empresa especializada em tecnologia, o tráfego da internet gerado por 60 mil pessoas nos estádios ultrapassou o tráfego normal dos milhões de pessoas com acesso à internet no Brasil inteiro. Era muito comum ver brasileiros nos estádios com um olho no jogo e o outro nos seus celulares. Foram 7,6 milhões de conexões à internet para envio de mensagens, fotos e comentários somente nas 12 primeiras partidas.

Entre os jogos, o mesmo acontecia – os brasileiros permaneciam conectados à internet e mostravam um nível de engajamento maior do que os outros povos, pois o volume de menções sobre a Seleção Brasileira em redes sociais era muito maior do que das outras seleções. E não eram somente os homens que estavam ligados à internet para curtir a Copa: 53% dos comentários sobre a Seleção Brasileira foram feitos por mulheres.

Com os brasileiros tornando esta a Copa da Internet, Google, Facebook e Twitter tiveram muitos motivos para festejar. Foram recordes em cima de recordes! O Google recebeu mais de 2 bilhões de buscas relacionadas à Copa do Mundo. No Facebook, já na primeira fase, foram 1 bilhão de postagens, e o uso da tecnologia na segunda fase foi ainda maior. E o Twitter não ficou atrás, pois os brasileiros queriam comentar as partidas em tempo real. Durante a fase de grupos, foram enviados mais de 300 milhões de tweets. O jogo entre Brasil e Alemanha (em Belo Horizonte, onde estive/foto) tornou-se o maior evento esportivo já comentado em rede social: mais de 200 milhões de interações no Facebook, conectando 66 milhões de pessoas e 35,6 milhões de tweets. O recorde anterior com 58 milhões havia sido Brasil e Croácia. E o terceiro gol da Alemanha rendeu 580 mil tweets por minuto, batendo o recorde anterior: o erro do chileno nos pênaltis, com 389 mil.

Com tanta gente engajada, a internet tornou-se a melhor fonte para se saber sobre as opiniões e os sentimentos da população. O orgulho nacional, por exemplo, estava registrado no Google, pois no Brasil o número de pessoas que buscavam pela Bandeira Nacional, em um único dia, era tanto, que seria capaz de encher a Arena Corinthians. Felipão era muito bem-visto, pois foi o técnico mais procurado no Google. E as buscas no Google mostravam que Bernard era seis vezes mais provável de substituir Neymar depois da sua lesão do que Willian. Através da internet, sabia-se o que a população achava da escalação da Seleção Brasileira. Por exemplo, 29% dos torcedores pediam nas redes sociais para Felipão tirar o atacante Fred, alegando que ele não saía da “banheira”. E o favoritismo pelo Neymar era bem claro ao se ver que ele tinha o dobro de menções do que qualquer outro jogador da Seleção.

A internet também registrou a transformação de jogadores em verdadeiros heróis da noite para o dia. As pesquisas pelo até então desconhecido goleiro mexicano Ochoa aumentaram 46 vezes no Brasil após suas incríveis defesas no jogo entre Brasil e México, tornando-o conhecido por todos. E Julio César recebeu um aumento de 24 vezes em pesquisas em todo o mundo após defender os dois pênaltis contra o Chile.

Nós, brasileiros, não ganhamos a Copa, mas deixamos uma marca irreversível no uso da tecnologia para nos mantermos ligados ao futebol. Nossa paixão pela internet fez do Mundial o evento esportivo com maior tráfego na internet até hoje registrado. Se a Copa não ficou para o Brasil, pelo menos fizemos dela a Copa da Internet!

* Doutor em Ciências da Computação, gaúcho, residente no Silicon Valley, Califórnia

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